O ziguezague pelas yungas, a floresta tropical argentina, no Caminho de Cornisa, parece hipnotizar. A sobreposição de tons de verde faz com que os olhos conectem o asfalto às folhas, embaladas pelo vento, a indicar a direção a seguir. É trilha acima, pela rota nº 9, saindo de Jujuy em direção a Salta, que os quilômetros, emoldurados por paisagens estonteantes, levam a La Caldera – um pueblito rico em história e simpatia.
Já às margens da rodovia, quem recepciona os visitantes é a imagem da Virgem Maria. A charmosa placa em madeira não deixa a cidade passar em branco. É do lado de lá do rio La Caldera que a cidade se fez. Reza a lenda – e a tradição -, que todo povoado começa com uma igreja e uma praça. Aqui não foi diferente.
A Iglesia Nuestra Señora del Rosario, construída no século XVII, é herança jesuítica. Foi alocada perto de uma rota inca e é testemunha do crescimento da cidade. Na praça, em frente, o busto do General tem lugar de destaque. O militar, um dos primeiros líderes a ter sucesso na luta pela independência, divide espaço com flores, um parquinho e um bucólico poço d’água.
Para o nome do pueblito, aliás, existem duas opções de origem: a homenagem ao sobrenome de um missionário jesuíta que por ali passou, ou, uma fundição de chumbo, numa fonte d’água, com formato semelhante ao de uma caldeira. Ambas as opções bem justificadas, não é?!
Mas, se tem uma imagem que representa La Caldera, essa imagem, é o Cristo Penitente. Com 26 metros de altura e 10 toneladas, a estátua é obra do artista plástico tucumano Juan Carlos Iramain. O Cristo, diferentemente da versão brasileira, está de braços cruzados – “por causa do frio que faz aqui”, brincam os argentinos.
Se a média da temperatura mínima no inverno é de 2º, no verão, a máxima alcança a casa dos 30. Aí, é nas águas do Dique Campo Alegre que os moradores da região – e turistas – encontram refresco para fugir do calor. O grande lago, que ocupa quase 50 hectares, foi construído em 1970 e é fonte de abastecimento para a região norte da capital, Salta. Com as chuvas do verão, o volume de água aumenta e, de novembro a abril, a represa vira ponto para atividades aquáticas. A pesca é liberada, assim como o nado. Aos sábados, os jovens da cidade se reúnem no clube de regatas e uma das atividades extracurriculares da escola pública da cidade é competir nas águas. Alguns desses alunos saíram daqui direto para competições nacionais. Um dos orgulhos da cidade!
Essa integração com a natureza faz com que o ecoturismo seja predominante em La Caldera. E não falta programação para quem quer se aventurar. São várias possibilidades, das quais três se destacam: ciclismo, trekking e cavalgada – maneiras distintas e intensas de se aprofundar na geografia da região.
Pedal | A empresa Pa Bike Salta é especializada em cicloturismo de montanha. Com bicicletas equipadas, capacete, coletes refletivos, luvas, água e carro de apoio, os turistas são conduzidos por Julio Nazareno Ruiz montanha acima. Literalmente. É que um dos trajetos disponíveis é, justamente, o Camino de Cornisa. 17 quilômetros de ziguezague contornando as montanhas da divisa das províncias de Jujuy e Salta até La Caldera. Uma das paradas é no Dique Campo Alegre. O grau de dificuldade é médio. As subidas são um pouco cansativas, mas Julio faz o percurso conforme o ritmo dos turistas. Existe também a possibilidade de alugar a bicicleta e fazer os passeios por conta. Your choice!
Trekking | Caminhar pelas montanhas da região é um privilégio e tanto. Rafael Guitian, da Turismo Alternativo Camino del Inca, sabe disso como ninguém. E conhece o lugar como poucos. Por isso, ao longo dos doze anos de experiência com ecoturismo local, criou vários percursos – do nível iniciante ao avançado – para que os turistas possam desbravar La Caldera com segurança. São passeios de 3 horas (que sobem até 1.800 metros) a percursos de mais de um dia (que atingem os 4 mil metros de altitude). Os tours incluem refeição e os grupos podem ser formados por até 22 pessoas.
Cavalgada | Rafael oferece também os tours à cavalo com opções de uma hora a sete dias! Vantagem: não é preciso saber cavalgar, os cavalos são mansos e obedecem às ordens do dono. (Acreditem! Sou prova disso!). Ao longo do trajeto, a variação dos cenários é apaixonante. E, do meio da pastagem, dá pra enxergar, ao fundo, a cidade de Salta. Uma baita experiência! Os passeios podem ser individuais ou em grupos de até 15 pessoas.
Rafael prepara o típico asado argentino, servido com os acompanhamentos tradicionais do país, feitos artesanalmente. Outro diferencial é a aula antes dos passeios: aprendi o passo a passo e pude selar meu próprio cavalo.
Como chegar
A partir de Salta | A capital tem aeroporto internacional e terminal rodoviário. Chegando por lá, você pode alugar um carro ou comprar uma passagem de ônibus da empresa local Saeta, que faz o trajeto até La Caldera. Há saídas a cada quarenta minutos. No site oficial você encontra todos os horários.
A partir de San Salvador de Jujuy | Basta pegar a rota 9 e seguir sentido Salta. Caso você opte pelo ônibus, as empresas disponíveis são: La Veloz del Norte, Chevalier e Flecha Bus. A viagem até Salta dura em torno de duas horas. Ao chegar na capital é preciso pegar outro ônibus até La Caldera.
Uma terceira opção é contratar o serviço de transfer + guia da Viajes y Turismo La Caldera, que cuida de tudo pra você: do transporte ao roteiro.
Quanto tempo ficar
Para explorar a cidade com calma, três dias são suficiente. O primeiro, para passear pelas ruelas e conhecer as construções históricas e a feirinha. O segundo, para fazer os passeios de bike e cavalgada. E o terceiro para descansar! Porque o hotel em que me hospedei merece um dia do seu roteiro!
Quando ir
O verão é a época mais quente – e com mais chuvas – mas, ainda, uma das estações mais interessantes para conhecer La Caldera. As paisagens ficam verdinhas e como o calor não é tão intenso, o clima é ideal para os passeios.
Onde ficar
Na Hostería La Caldera, sem dúvidas. Completamente fora dos padrões de hospedagem tradicionais, o típico casarão argentino foi adaptado para receber hóspedes. As ampliações fizeram com que o número de quartos chegasse a 25, em 5 tipos de acomodação. A convite dos proprietários, fiquei na suíte principal. Um espetáculo à parte. Ampla, com decoração sofisticada, banheira de hidromassagem e uma varandinha pra lá de bucólica com vista para as montanhas. Tarifas justas! A Hostería tem uma piscina, salão de festas e uma ampla área verde ao redor. A programação semanal incluí até aulas de yoga para os hóspedes. Muito bacana mesmo!
Onde comer
El Coya
Feito de painéis coloridos a contar sobre a história e cultura locais, o El Coya é um restaurante familiar que reúne no menu os principais pratos típicos argentinos – das empanadas ao locro, passando pelas empanadas. É o próprio Fernando quem recepciona os clientes e garante que tudo seja servido com perfeição. O restaurante é uma opção econômica que esbanja sabor! Abre de terça a domingo, das 9h às 23 h. Todos os dias há uma opção de menu econômico de prato principal + sobremesa por 90 pesos.
Hostería La Caldera
Para um jantar mais requintado, a Hostería tem um menu rico em entradas típicas, pratos gourmets e sobremesas de encantar. Além de uma carta de vinhos com os principais vinhos argentinos. O ambiente é lindo e a trilha sonora, pra lá de agradável.
Devo colocar La Caldera no meu roteiro?
Com certeza! Um respiro em meio às urbanas Salta e San Salvador de Jujuy, é uma parada excelente para curtir a natureza e dar aquela descansadinha merecida no meio do roteiro.
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