Feito roda de bamba de gigantes coloridos, pelo salão principal do Centro Cultural do Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, o estandarte na mão da dançarina, a girar, anuncia: “meu nome é samba”. Mas, o nome em questão é outro, indicado pelas iniciais na bandeirola. “Heitor dos Prazeres é meu nome”, se apresenta a exposição aos visitantes recém-chegados.
“Este prazer que eu tenho no nome é o prazer que eu divido com o povo. Este povo com quem eu reparto este prazer. Este povo que sofre, este povo que trabalha, este povo alegre que eu compartilho a alegria desse povo”.
O verso dá o tom e sintetiza a mostra que colore as dez salas da exposição do multiartista carioca, Heitor dos Prazeres.
É o povo negro quem tem voz e vez nas canções e pinturas e figurinos e móveis, traduzíveis como extensões de Heitor.
Fruto de uma curadoria assinada pelo jornalista Haroldo Costa, junto com Raquel Barreto e Pablo León de La Barra, mais de 200 itens traçam uma retrospectiva artística do pintor, músico, compositor, poeta, ogã, figurinista, coreógrafo, estilista e designer de moda e mobiliário.
O dono do nome
Nascido uma década após a abolição da escravidão, Heitor dos Prazeres cresceu numa área do Rio de Janeiro que ele chamava de África em miniatura – a junção dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo, na zona portuária.
Dali, da janela do ateliê onde pintava o mundo como o via, ele eternizou o Morro da Providência com uma das características que o diferenciaria dos demais artistas da época: a capacidade de colocar os negros em primeiro plano, jogando luz e cor sobre a vitalidade da favela.
Mas, não apenas. Nas telas, eternizou também outros recortes da experiência coletiva negra, num momento marcado pelos movimentos migratórios, mudança do campo para a cidade, surgimento das favelas, controle social e repressão policial.
Ao ignorar as críticas que descreviam sua arte como primitiva, Heitor dos Prazeres criou um estilo próprio, ensinado e reproduzido por artistas que o acompanharam no fim da vida.
Vida artística consagrada pela participação em exposições que marcaram sua carreira, como a 1ª Bienal de Arte de SP, em 1951, e coroada pela seleção para o I Festival de Artes Negras em Dakar, no Senegal, onde constatou-se que o estilo tido como primitivo era condizente com o de outros expoentes internacionais.
Eu sou o samba
Compositor de mais de 200 canções, de inúmeros estilos musicais (marcha, choro, fox, valsa e baião), no samba, Heitor dos Prazeres se imortalizou. Compôs com Noel Rosa e era frequentador da Casa da Tia Ciata, com quem dividia o espaço com outros grandes nomes, como Cartola, Pixinguinha e Paulo da Portela.
Da Portela, aliás, foi um dos fundadores, assim como da Mangueira e da, então, Deixa Falar (mais tarde transformada em Estácio de Sá). Está nas raízes de escolas de samba e de blocos e de ranchos.
Movimento traduzido em ritmo, letra, forma e cor. Entre as vertentes artísticas, juntava moda e arte, ao desenhar e confeccionar os figurinos das Pastoras que o acompanhavam nas apresentações. Mais um, dos muitos talentos que a exposição “Heitor dos Prazeres é meu nome” convida a conhecer – e se inspirar.
Se programe | “Heitor dos Prazeres é meu nome”
Local: CCBB RJ – Rua Primeiro de Março, 66, Centro, Rio de Janeiro
Ingresso: gratuito, com retirada na bilheteria ou pela internet
Em cartaz até 18 de setembro
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